Dra. Neliana Buzi Figlie

 

A construção do conceito de adolescência é recente. Desde os povos primitivos até antes do Sec. XX, apenas o aspecto biológico – a puberdade – era considerado como o marco da transição da infância para a vida adulta, muito embora as velocidades de amadurecimento dos demais setores ocorressem, e ocorram, em momentos não coincidentes. Atualmente os pré-requisitos para a transição em direção a vida adulta tendem a tornar esse processo mais longo, complexo e dolorido.  Diante dessa configuração de mudanças pode ocorrer a experimentação de substâncias psicoativas (SPA). O contato precoce com SPA pode causar prejuízos extensos e comprometimento permanente, além de exposição ao risco de evolução de uso em direção a uma futura dependência química.

Neste contexto é  importante reconhecer os fatores de risco e de proteção ao uso de SPA nessa faixa etária. Desse modo, pode-se atuar de maneira preventiva objetivando a estimulação dos fatores que podem proteger o jovem e a minimização dos fatores favoráveis ao uso.

A definição de gênero pode ser compreendida a partir do conjunto de características que a sociedade atribui ao sexo biológico através das regras sociais, expectativas e comportamentos considerados adequados e típicos aos meninos e meninas. Nesse sentindo, os fatores culturais atuam na determinação dos fatores de risco para o uso de SPA, refletindo na maior ou menor vulnerabilidade do uso de SPA entre os gêneros.

Apesar de muitas vezes compartilharem a experiência de uso na adolescência, as adolescentes do gênero feminino não apresentam as mesmas motivações para o início do uso de SPA quando comparadas aos adolescentes do gênero masculino. Sabe-se que a motivação de uso pelas meninas frequentemente está associada ao enfrentamento de situações, enquanto que para os meninos o uso, em geral, acontece por curiosidade.

O papel da família como agente influenciador, predispositor e até mesmo inibidor do uso de SPA entre adolescentes também é alvo de interesse nos estudos internacionais. Pesquisas apontam para a importância de fortes vínculos parentais como limitador de uso de SPA entre as meninas

O uso de SPA pelas mulheres em idade fértil está progressivamente ocorrendo em idades mais jovens. Nesse sentindo, a população de adolescentes expostas aos riscos de uso de SPA e suas consequências associadas, como gestação não planejada, comportamento sexual de risco, exposição a situações de violência, acidentes de trânsito, homicídio e suicídio, vem aumentando.

Em contraponto, nos casos de gestantes em uso de SPA, ocorre uma maior exposição dos fetos a um ambiente uterino inóspito ao desenvolvimento, além de um maior risco de aleitamento em manutenção do uso de SPA por parte dessas mães.

Atualmente sabe-se do impacto de determinadas SPA na gestação:

  • Tabaco: A exposição ao tabaco durante a gestação acentua as chances de aborto espontâneo, insuficiência placentária, retardo do crescimento intrauterino (RCIU), parto prematuro e gestação ectópica.
  • Álcool: O consumo de álcool por gestantes configura-se em um sério problema na área de saúde pública, uma vez que o álcool é uma das SPA que mais traz danos ao feto, podendo manifestar-se por um quadro completo, denominado síndrome alcoólica fetal (SAF), ou um incompleto, conhecido como efeito alcoólico fetal (EAF).
  • Cocaína e Crack: A utilização de cocaína e/ou crack no período da gestação acentua o risco de complicações e de desfechos indesejáveis como: abortos espontâneos, descolamento prematuro de placenta, ruptura prematura de membranas, parto prematuro e RCIU (restrição do crescimento intra uterino). Apesar de não haver um consenso, existem estudos que descrevem uma possível associação do uso dessas substâncias ao maior risco de defeitos congênitos.
  • Maconha: O conhecimento a respeito do real impacto da maconha na gestação ainda é contraditório. Existem estudos que relatam um maior risco de parto prematuro e outros que constatam prolongamento da gestação.

 

Estudo de revisão recomenda que o uso de SPA na lactação seja fortemente desencorajado, não sendo imperativa a interrupção do aleitamento, mas sim a ponderação dos riscos e benefícios de tal procedimento, além da discussão de estratégias alternativas para reduzir o impacto advers
o como, por exemplo, a não interrupção da amamentação nos casos de uso eventual de SPA e a orientação de que a mãe aguarde 24 horas para amamentar novamente, muito embora ainda não exista um consenso nesse aspecto.